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O meu corpo é um lugar que não é meu e eu perdi-me nas horas em que não existi. O resultado é a vida que escolhi e o vazio que anseia por me abraçar.
Nada tenho de meu e nada foi o que construí para mim. Apenas assinei um contrato, confirmando a minha desistência e entregando como dote todos os meus sonhos.
Neste tear da minha vida foram os sonhos os bens preciosos que criei, vesti-os de seda e de cetim, lancei-os sobre mim.
A minha pele aveludada da cor do marfim é o resultado tecido e agora que sinto como se sonhasse, sinto a fome crescente de um toque que não chega.
Rasgo a pele entre espinhos, caminho descalça sobre cardos, mas nos lábios carrego um sorriso e no sorriso espelho o corpo que não profanei.
Não amei, mas deixei que me amassem. Fiz o bem, é o que importa.
A alma, contudo, já não se contenta e por entre os fios que teci, reclama liberdade. Primeiro num murmúrio, depois num gemido e agora os seus gritos impedem o meu dormir e se não durmo perco a viagem pelos vales consagrados por verdadeiros heróis.
Já não ignoro a mensagem, contida em cada lágrima do meu sangue, apenas faço o luto que é devido a todas as horas que matei. Neste meu recolher sofro e no meu sofrer liberto-me, rasgando o enorme casulo em que me abriguei.
Em breve as asas que teci estarão prontas e chegada a hora anunciada partirei, de sorriso nos lábios, voando sobre cardos, de pele aveludada e de cor de marfim.
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