quarta-feira, 4 de maio de 2011

Uma pena de seda



Acordo com celestiais acordes, uma melodia que invade os meus sonhos e me chama para terra. Pianinho doce que repete, em cada andamento, um «estou aqui».
Procuro a origem da música e tudo que encontro é uma neblina rastejante que penetra todos os
recantos como se procurasse por mim.
Sinto o coração nos ouvidos, aperto-o por entre os lábios, estrangulo-o no abraço das mãos... Tenho medo!Tenho medo porque estás aqui...
Estou descalça, no corpo um vestido da cor do luar... Abraço-me e avanço para onde a névoa é mais densa.Caminhos de puro branco, paredes de algodão, toldam-me a visão e obrigam-me a procurar um ponto de referência. Escolho o pulsar de luz intermitente para onde todas as minhas escolhas me remetem. Não tenho outra opção, mesmo que quisesse não saberia como voltar para trás.
Nuvens de tule branco cobrem um coreto esculpido em marfim acetinado. No centro, um piano de cauda que toca sozinho.
A melodia é envolvente e cresce quando me aproximo.
«Meu amor» - diz. - «Estás aqui!».
Não consigo falar... Penso e respondo:
_ Quem está?
«Estás tu, estou eu» - murmúrio que um bater de asas empurra, suavemente, contra mim.
_ Quem sou e quem és tu?
«Somos um. Apenas um...» - suspira um vento brando da asa criado.
_ Mostra-te! - Reclamo ansiosa.
«Foges...»
_ Fico! - Juro sem prometer.
«Fecha os olhos...»
Fecho os olhos e sinto-me carregada pelo ar. Seguro com força o tecido que lhe cobre parcialmente o peito, aninho-me debaixo do queixo, sem me atrever a abrir os olhos.
Sinto o cheiro perfumado do linho. Vejo branco sobre branco, ainda que permaneça de olhos fechados.
Sinto a camisa deslizar, suave, suave... Vejo pele sobre pele, ainda que sem olhar.
Beija-me com os seus lábios de pêssego carnudo, invade-me o hálito da aurora numa manhã de Primavera.
Toca-me deixando em brasa cada palmo de pele. As mãos, que me mantêm segura, têm a força do Verão.Sinto-me perder em delírios de linho...
O corpo não aguenta e forma um arco involuntário, enquanto os meus dedos seguram as rédeas de um cabelo negro como a noite. Os meus braços incentivam-me a percorrer-lhe as costas, agarro-me à seda da sua pele e puxo-o para mim... Voamos juntos, bem alto, como um só...
No êxtase abro os olhos e mergulho, por instantes, num caudal de ternura.
_ Amor, estás aqui! - Não contenho o suspiro na minha voz.
Acordo, em sobressalto. Desconcertada, olho em redor e não vejo nada de novo.Afinal, tudo não passara de um sonho.
Como que a responder, vinda dos meus cabelos, uma pena de seda com cheiro perfumado de linho caiu-me gentilmente nas mãos.

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