quarta-feira, 29 de abril de 2015

Além da confissão

Insistes numa história que não passa de uma narrativa
e o que da minha parte acrescento e conto,
creio que não queres ouvir:
_Há verdade na mentira.

A história pesada, cravada em cada passo que dou,
é verdade e realmente aconteceu
[Reforço para que não duvides]
É bagagem minha que carrego no coração.

Quando parti, deveria a ter perdido ou jogado fora.
Levei-a comigo por onde fui e aonde cheguei...
Não te vou dizer porque ficou...
Creio que nem eu mesma sei.

Ao longo de décadas, trocámos silêncios de circunstância
Por vezes, até consegui ignorar a tua presença…
Mas sempre houve algo no ar... Insolente afecto,
que eu, constrangida, refugiei-me na segurança da indiferença.

Não era somente de ti que fugia
e indiferente, na verdade, eu não fiquei
Mas como e para quê o dizer-te?
O juízo que me toma já não é completo
e brincar com o fogo não me faria bem…

Contigo, tanto ardi, que me queimei
- foi difícil viver perdida  -
e não curando essas primeiras feridas,
tornei a dor numa velha conhecida.

Não falemos mais… Deixa que me recolha
A ti, a quem amei com puro ardor,
[tu que habitas nos ecos da minha mente]
eu peço, mais do que me confesso:

_Amor, promessa de vida, não te faças presente...

Fotografia de Fábio Martins (contém hiperligação para a página do Autor)

Inspirado no poema "Ainda é infinito" de Geraldo Coelho Zacarias, PEAPAZ


terça-feira, 28 de abril de 2015

Ainda que seja infinito




Sim, uma vez amado, o amor perdura no infinito,
ainda que acabe e entre nós, acabou.
Não há porta aberta ou entreaberta
que o desengano bateu e a mágoa fechou.

Verdade: o céu era pouco para o que eu sentia
Não precisa evocar, não o esqueci…
… Esse fogo que em mim ardia…
[Que eu tanto… sempre… Céus! Eu queria…]

Sim, o teu veneno, esse orgulho de predador
Devorar o que era ainda inocente
Jogar, como se não te importasses,
Crês que esqueci? Que estou demente?

As bocas que beijastes, eu limpei ao olhar no teu rosto
As camas onde te deitastes, até tu esqueceste…
Chamaste-me de embriaguez carnal, fome dos sentidos
E foi real e foi intenso, e eu perdi e tu perdeste…

Tu me querias… Verdade, tu me tiveste…
Tivesse sido nosso segredo
Preferiste que fosse história de jogador
Trunfo ou troféu, jogo sem glória.

Não, não te concedo e nem concebo
Não me fales de amor!
Era nosso e… acabou…
[Ainda que seja infinito]






Inspirado no poema "Vê como penso", de Geraldo Coelho Zacarias, publicado na PEAPAZ 




quinta-feira, 23 de abril de 2015

Encontro com o destino, numa rua que se desce...

Ele sorriu, enigmático... Desafiou o tempo e desceu a rua.
Apostava num reencontro que não tinha lugar ou hora marcada e ganhou... Decorridos poucos metros,  a encontrou e em curta distância, seguiu-a de longe. 

A marcar o passo, um caminhar paciente... As possibilidades, ainda que remotas, eram provocadoras... E de tal forma o provocavam que, volta e meia, tropeçava absorto em pensamentos.
[O destino o favorecia] - pensou, ainda que ela não o visse, como tantas outras vezes não o viu...

Ela sorriu, misteriosa... Desafiou o tempo e desceu à rua.
Caminhava ao acaso, sem lugar definido e sem hora a marcar o passo. Algo a impelia a ir... Sair, sem razão... Não apostava (tem aversão a apostas)... No entanto, a estrada é feita de reencontros e esta ideia de tal forma a provocava que, volta e meia, tropeçava absorta em pensamentos.
[O destino... Tu e eu...] - pensou, ainda que sabendo que se o encontrasse, voltaria a fingir que o não tinha visto.

Desafiavam o tempo, numa rua que tantas vezes desceram juntos e outras tantas subiram afastados. No somatório, perderam para as vezes que apenas caminharam por ali, completamente sós e em busca um do outro. Sorriam para si, até que... [o destino os tentava, colocando-os num frente-a-frente que não poderiam desmentir e por reflexo ou instinto...] Ela parou e ele susteve a respiração. Rindo, de peito aberto, ela olhou para trás e o viu... Olhos nos olhos, respiravam, finalmente...


[O destino o favorecia] - pensou, enquanto a seguia, como tantas vezes o fez, acelerando o passo... Ela caminhava apressada, porque lhe fugia, como sempre fugiu. Ainda assim, esperava-o... Uma vida e noutra vida... Um jogo de amantes... Um preliminar intemporal... A adrenalina de tão pura empurrava o coração do peito. Ele tremeu, ela tremia.

Caminhavam lado, a lado. Era um caminhar expectante... As possibilidades, ainda que remotas, eram tão provocadoras... E de tal forma os provocava, que volta e meia, ambos tropeçavam absortos em pensamentos... 
Ele esticou a mão, como se os dedos fossem ímanes, na esperança que ela a agarrasse. Ela sorriu, como se fosse o sol do meio-dia, e sem uma palavra, segurou-lhe a mão.

[O destino os favorecia] - pensaram, ao sentir as primeiras gotas de chuva. A rua deserta, o céu a abrir o caminho, um prédio a oferecer abrigo... Uma corrida, sem aposta, onde se perde a roupa e se ganha tudo o resto... Convite mudo, que não se recusa, quando nas mãos se segura o amor de uma vida.

O amor... Sem lugar, sem hora marcada... Ganhou.
O Tempo... Alaga, enquanto espera... Numa rua que se desce...

Fotografia de Fábio Martins (contém hiperligação para a página do Autor) 

domingo, 19 de abril de 2015

Equívoco (inspirado no Renascer de Geraldo Coelho Zacarias)

Não... Tarde não será... Vê como eu penso:
perdi-te ontem... fui covarde...
Mergulhado num mar de timidez imenso...
Porém, pra felicidade... nunca será tarde!... 

Os anos nos deixaram marcas, cicatrizes
em nossos rostos; corpos... Porém alheios
devemos buscar nós, momentos tão felizes;
tu, na boca minha; eu nos teus seios!...

E hão de invejar-nos tanta gente;
e nós nem ligaremos pra o que tanta gente diz...
Se há em mim hoje esse desejo tão ardente;
é o mesmo de ontem, de ser e te fazer feliz!...

Vem... que nos espera o altar para o culto tão solene,
do santo e profano amor que entre nós arde...
e pra sempre eternizado e tão perene;
porque pra felicidade... nunca será tarde!...

de: Geraldo Coelho Zacarias, 3 janeiro de 2015, em PEAPAZ


Equívoco

Vê como penso:

Ontem, perdeste-me. Nem sabes quando ou porquê.
Ainda assim, amei-te num amor magoado
que o tempo marcou mais na alma do que no rosto,
[como um fogo que não morre e que não pode ser apagado].

Na tua ausência, afastei as melodias que nos tocaram,
condenando as suas letras ao degredo
[Os sentidos privei do que pudesse potenciar a memória.
Ás palavras acedo apenas em silêncio e em segredo].

Fugi de mim como se pudesse esquecer o desejo ardente sob o qual tremi
Concentrei-me no momento em descobri toda a trama:
Ardil. Traição. Enredo que roubou mais que a inocência...
A verdade que absorvi como veneno: não te ama, não te ama...

Ser feliz...  O meu corpo como cálice que levaste aos lábios...
Um altar de carne e cetim erguido entre paredes brancas,
Desejos que se transformaram em loucura e fatalidade,
levaram à morte do arrepio e do suspiro, no movimento das ancas.

Não... É tarde e de tão tardia hora, o meu peito não contém a dúvida:
Ainda que não acreditando numa felicidade que tarda...
Por que razão, te equaciono hoje, se ontem me perdeste?

de: Ema Moura, 19 de abril de 2015, em PEAPAZ

Fotografia de Fábio Martins (contém hiperligação para a página do Autor)